Diário de uma loira

Trocadilhos

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Caros leitores e leitoras, compartilho aqui uma passagem do meu diário de intercâmbio no ano passado:

17 junho 2013

Eu estava com vontade de escrever há tempo. Só não sabia o quê. Claro, tinha várias histórias reais para contar, mas nenhuma delas tentou meus dedos a escreverem no computador. Talvez, inconscientemente, eu tenha feito o que fiz hoje justamente para ter algo que me impele a entrar em ação. Ok, ok. A verdade é que ainda tenho de aprender a manter minha boca fechada e a pensar quatro vezes antes de abri-la.

Contudo, minha burrada de hoje tem precedentes, por isso irei começar do início. Eis uma breve contextualização: estou trabalhando num café aqui em Vancouver. Meu primeiro emprego – iei! Ainda me sinto apavorada e animada em relação a ele. Por causa de meu nervosismo – minha voz e rosto infantis ajudam, obviamente – tenho certeza de que meus colegas de trabalho me veem como uma criança fofa e desajeitada, ou só desajeitada. Tipo um Bambi. Também preciso mencionar que tem um cara no meu trabalho, o Adam, que é LINDO. L-i-n-d-o. Típica beleza canadense: olhos e cabelos claros, lábios finos e atraentes.

Agora que forneci um breve resumo de minha situação, comecemos com minha ruína. Um dia o Adam estava contando a nós sobre seu sobrenome, que é Dick (Pinto ou Babaca em inglês, dependendo do contexto). Ele traçou uma longa trajetória sobre suas aventuras: a clássica piadinha que fazia com suas namoradas (“Yes, I am a Dick”, que quer dizer “Sim, sou Babaca”), sobre o modo como assumiu o outro sobrenome para o e-mail profissional e sobre o fato de que ele gostava de assinar Dick durante o Ensino Médio por que achava engraçado. Finalmente, finalizou sua história da seguinte maneira:

– Mas às vezes eu gosto de Pinto.

E a idiota aqui não pôde conter a piada:

– Oh, você gosta de um pinto de vez em quando, hein?

– Larissa! – ele olhou para mim, surpreso.

– Me desculpa! – implorei prontamente, mortificada com minha ousadia.

Ele sorriu tranquilo e disse que estava tudo bem. Além disso, era bom me ver saindo do meu casulo. Como ele não reagiu de forma negativa, não me preocupei muito com o ocorrido. Cheguei até a rir comigo mesma algumas vezes.

Alguns dias depois, enquanto encontrava-me concentrada em alguma tarefa no trabalho, ouvi o final de uma conversa que Adam e outro colega estavam tendo sobre assobios. Comentei, após finalizar minha pequena missão, que não sabia assobiar. Adam, como todo ser humano que ouve minha triste confissão, tentou me ensinar:

– Put your lips togheter in a pussy face [Faça biquinho que nem uma vaca] – imagino que ele disse outra palavra e minha mente pervertida entendeu “pussy” (vaca, na minha apressada e pobre tradução) – e coloque a língua no meio da boca.

Já sabendo que iria fracassar, fiz o que ele mandou. Só consegui assoprar.

– At least I know how to blow. [Pelo menos sei como assoprar] – conclui após minha tentativa.

Ele riu brevemente e explicou:

– Era essa a piada que eu estava contando ao Blake. Sobre uma garota comentando com um cara que ela não sabia assobiar, mas sabia “blow”.

Porque “blow job” em inglês quer dizer boquete, mas “blow” também é assoprar. Malditos trocadilhos! O próprio Adam brincou:

– Essa teria sido uma piada perfeita para o dia em que você falou sobre o meu nome Dick.

– Yeah, você sempre pode contar comigo para fazer piadas sujas. – repliquei aliviada por ele levar tudo numa boa.

– Só fico feliz por enriquecer sua experiência aqui no Canadá.

– Pois é, o que seria da minha estadia aqui sem esse tipo de coisa?

– Não somos os EUA, mas tentamos o nosso melhor.

Tudo certo até aqui. Ele demonstrou senso de humor e fez uma piada sexual para ficarmos quites no departamento. Podia ter terminado aqui, não podia?

Mas é claro que a loira aqui passou a imaginar como seria provar seus lábios, provocá-lo com beijos no pescoço, encaixar minha cabeça no seu ombro e descansar ali. Então, no dia seguinte, como tinha notado que ele tinha a sexta de folga, num momento de tédio, perguntei a ele:

– Então, o que você vai fazer na sexta?

Ele respondeu “nada demais” e aí acrescentei rapidamente:

– Não estou te chamando para sair ou dando em cima de você. Só disse isso porque você deu um sorriso estranho.

Não, ele não sorriu de forma afetada. Acho. Agora não sei de mais nada. Só sei que em uma única frase consegui:

  1. Demonstrar que estou afim dele, já que o pensamento de sair com ele passou pela minha mente;
  2. Mostrar-me arrogante ao insinuar que ele mesmo pensou em sair comigo ou algo do tipo;
  3. Insultá-lo ao alegar que não gostaria de sair com ele.

E sabe a melhor parte (eu a guardei para o final)?

ELE É MEU CHEFE! O gerente do café.

Alguém me mata, por favor?

Adam, o fofo, tentou não me deixar muito desconfortável mudando de assunto e agindo como se nada tivesse acontecido. Passei o resto da manhã querendo me matar. Depois concluí que seria uma medida muito drástica, e desejei apenas sumir magicamente da face da Terra. Durante ambos os estágios de humilhação, lutei contra a vontade de bater minha cabeça na parede repetidas vezes (não dá para fazer isso enquanto se está trabalhando na frente de outras pessoas – incluindo do meu “freaking boss”).

Querendo desabafar com alguém, liguei no meu intervalo para minha amiga brasileira que também está fazendo intercâmbio. Ela já sabia do “Dick Episode” (gostei do nome), mas tive de atualizá-a sobre o “Blow Job Episode”, e enfim expus minha mais recente burrice. Ela me consolou afirmando que Adam não liga para o que acontecera, mas me desanimou lembrando-me de que agora ele sabia da minha quedinha por ele.

Sabe onde passo meus intervalos? No café. Num raio auditivo aos ouvidos do indivíduo em questão. Mesmo que tenha falado em português, tive de explicar o trocadilho “blow job” à Alana, que não conhecia a expressão, o que quer dizer que se Adam ouviu essa palavra (e se qualquer outro cliente escutou, na verdade), só piorei minha situação.

Com licença, acho que vou ceder à tentação de bater minha cabeça na parede agora.

Semanas depois não resisti fazer outra piada suja. Com tanta idiotice rolando dentro de minha mente, tinha vazar algo uma hora, afinal. Achando que não deveria me limitar a Adam, fiz a piada com um colega australiano, o Blake. Ele estava guardando um talher numa prateleira perto de mim e comentou com seu singular sotaque:

– That guy gave me this, but I don’t want a fork. [Aquele cara me deu um garfo, mas não quero forcar nada.]

Não pude deixar essa passar (bem, poderia ter deixado, se pensasse antes de falar):

– Oh, you don’t wanna “fuck”? [Ah, você não quer fornicar?]

– Larissa! – exclamou exatamente no mesmo tom que o Adam usou da primeira vez que demonstrei meu lado pervertido.

Não passou pela minha cabeça naquele momento que poderia parecer um convite ou uma cantada. Acho que só passou ar ali mesmo… E Blake, fofoqueiro como todos os outros funcionários daquele café, foi contar ao Adam.

Este, por sinal, parece também apresentar problemas em refrear as piadas sujas. Duas semanas depois do meu deslize com Blake, num dia comum de trabalho, vi que Adam estava ocupado no caixa, provavelmente precisando ajudar um colega no bar. Tentando consertar meu erro de deixá-lo fazer o que tecnicamente era minha função principal, aproximei-me durante uma transação e ofereci:

– Quer que eu termine o trabalho?

– That’s what she said. [Foi o que ela disse.] – replicou bem humorado. Na frente de uma senhora e outros clientes.

Todavia, não eu sabia o que tornava minha frase maliciosa. Percebendo minha confusão, ele estava prestes a explicar a mim o que aquilo queria dizer, mas a Julia, a subgerente, mandou ele ficar quieto. Claro que pedi a outra colega por uma explicação quando tive a chance.

Ao menos sei agora que não sou a única a falar besteiras em horas inadequadas.

4 comments on “Trocadilhos

  1. marinafaedda
    August 14, 2014

    Ai Larissa… been there, done that! Sou mestre em fazer essas coisas e depois ficar sem graça com a repercussão da história… e nem tenho a desculpa da loirice!

    Adorei o texto! Um beijo!

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This entry was posted on August 14, 2014 by in Loirice and tagged , , , , , .